
- 11 de Março, 2023
Uma situação de sobre-endividamento é geralmente precedida por um período de “má dívida”, no entanto, não é tarde demais para recuperar o controlo das suas finanças. O que é estar sobre-endividado, como saber se está e como antecipar o sobre-endividamento
Com a evolução da tecnologia e o aparecimento de novos meios de consumo, ( ex; cartões de crédito, compras online, aquisição de criptomoedas, etc.) os nossos hábitos mudam. Esta evolução torna-nos mais consumistas e comodistas, estamos mais focados na aquisição imediata de bens enquanto inventamos novas necessidades superficiais onde as tradicionais compras em lojas estão a tornar-se um hábito obsoleto.
Com tanta possibilidade e facilidade em gastar nosso dinheiro, é necessário ter muito cuidado e ser bastante disciplinado para evitar entrar em sobre-endividamento.
O que é o sobre-endividamento
O sobre-endividamento é quando alguém se encontra numa situação, onde os seus rendimentos não são suficientes para fazer face às suas despesas correntes e dívidas contraídas. Este flagelo atinge, de facto, muitas famílias portuguesas apanhadas numa espiral de crescente instabilidade financeira.
Uma vez estabelecida, esta situação agrava-se com o passar do tempo com as pessoas a acumular cada vez mais dívidas. Os juros fazem aumentar os montantes em dívida e a situação financeira começa a descontrolar-se levando à total incapacidade em pagar as rendas, mensalidades de empréstimos, entre outros encargos correntes.
Endividamento VS Sobre-endividamento
Uma coisa deve estar clara quando se trata de sobre-endividamento, nem todos os que estão endividados, estão necessariamente sobre-endividados. É verdade que as dívidas devem ser entendidas como obrigações de pagamento, mas só falamos em sobre endividamento quando os meios financeiros próprios já não são suficientes para o pagamento das suas despesas, ou seja:
- O endividamento designa simplesmente a situação de um mutuário que se comprometa a reembolsar um empréstimo para financiar as suas despesas e projetos;
- Sobre-endividamento representa a deterioração de uma situação financeira, a ponto de não conseguir pagar mais as suas dívidas.
O que pode causar sobre-endividamento
O sobre-endividamento nunca acontece por acaso, as causas podem ser ativas ou passivas, ou seja, podem vir diretamente ou não do sobre-endividado. As razões mais frequentes identificadas costumam ser: - Acontecimentos imprevistos que dificultam o pagamento das despesas de subsistência e o reembolso de créditos pendentes. Pode ser derivado de uma situação de desemprego inesperado onde o encargo fica apenas a cargo de um membro do agregado familiar, um aumento de renda, problemas familiares que acarretam custos elevados, problemas de saúde de um ente querido, divórcio ou morte do cônjuge.
O inesperado pode perturbar repentinamente o equilíbrio financeiro de uma família e bloquear a capacidade de pagar despesas de empréstimos. O sobre-endividamento passivo é mais subjetivo e recai diretamente sobre o endividado. - A má gestão do orçamento muitas vezes leva ao endividamento por meio de comportamentos de risco, como acumulação excessiva de empréstimos (principalmente para saldar dívidas mais antigas), despesas maiores que as receitas, não declarar todos os créditos em dívida ao se candidatar a um novo empréstimo, entre outros.
Sinais de alerta
É muito importante entender completamente os sinais de alerta dos sobre-endividamento para o conseguir evitar. Estes são apenas alguns dos sinais a ter em atenção:
• Ter dificuldade em criar poupanças;
• Orçamento desequilibrado negativamente;
• Acumulação de pagamentos em atraso;
• Estar sujeito a penhoras;
• Contactos por parte dos credores.
Se vive uma ou mais situações acima descritas, é fundamental encontrar uma solução para estes problemas de forma a evitar ficar posteriormente numa situação complicada de sobre endividamento. É aconselhável não esperar que a sua situação se deteriore nem esperar por
vários atrasos de pagamento antes de avaliar a sua situação financeira.
Evite o sobre-endividamento
Para evitar o sobre-endividamento, é imprescindível avaliar a sua situação financeira de forma objetiva. É essencial ter uma ideia precisa das suas receitas e despesas antes de pedir um empréstimo. No entanto, esta avaliação por si só, não é suficiente, é também necessário verificar regularmente a evolução das suas finanças e estabelecer o seu orçamento de forma equilibrada. - Elabore o seu orçamento para evitar viver além das suas possibilidades. Crie uma tabela na qual registará a entrada de dinheiro na sua carteira como, o seu ordenado, as suas despesas, o valor das mensalidades ou débitos diretos (água eletricidade, gás, comunicações, alimentação, etc.)
Se estes pagamentos satisfizerem e as suas necessidades básicas, o montante que resta pode então ser direcionado para bens secundários (vestuário, eletrodomésticos, decoração, viagens, restaurantes, etc.). No entanto, é sempre bom deixar algum dinheiro parte para despesas imprevistas como, uma avaria no seu meio de transporte, problemas com a casa ou com a sua saúde. - Controle as suas compras, ter um cartão de crédito pode levar a tentações fazendo-o gastar dinheiro em coisas desnecessárias. As compras por impulso, devido à facilidade em pagar com o cartão, são um dos grandes problemas dos consumidores. Antes de fazer uma compra, repense a forma como utiliza o cartão e não deixe que as dívidas se acumulem.
Analise cuidadosamente as suas necessidade e prioridades, compare sempre os preços e não hesite em escolher produtos recondicionados ou reciclados. Obviamente, não deve descartar a análise à qualidade, quem diz preço baixo, não significa propriamente um bom negócio, por vezes, o barato sai caro.
Hoje em dia existem apps disponibilizadas pelos bancos para informá-lo através de alertas automáticos de forma a controlar melhor as suas despesas, pode também confirmar os seus gastos no extrato mensal para saber em que gastou o dinheiro. - Renegoceie tudo – se estiver endividado ou sobre-endividado é porque provavelmente, tem muitas obrigações de pagamento a cumprir, que vão desde serviços básicos e essenciais, como eletricidade, gás, água, passando por outros, não tão essenciais, mas também importantes como, crédito automóvel, seguros, telecomunicações, etc. Possivelmente não vai conseguir renegociar todos, mas se conseguir em alguns, poderá sentir um desaperto financeiro importante para o futuro.
Nos contratos da energia, a Entidade Reguladora dos Serviços Energético (ERSE) disponibiliza no seu site, um simulador que pode ajudar a perceber qual o melhor serviço que se adequa às suas necessidades. Nos créditos habitação, pode entrar em contacto com o banco e pedir para renegociar as condições atualmente em vigor de modo a tentar baixar o spread ou outros
produtos associados como é o caso dos seguros, por exemplo.
Nas telecomunicações, pode ajustar os pacotes consoante a sua necessidade, será que necessita de tantos canais de televisão? Quantas pessoas do seu agregado familiar têm telemóvel e quanto pagam? O ideal é pedir propostas às operadoras e avalie a melhor opção para a sua carteira.
Quanto aos seguros pode comparar o que está a pagar e quais as coberturas que este engloba. Se não tiver tempo ou engenho para pesquisar e comparar, existem empresas que fazem esse trabalho por si, algumas sem custos associados. - Consolidar os créditos pode ser também uma forma de evitar o sobre endividamento. Todas as pessoas que têm um crédito e não tenha entrado em incumprimento podem contrair um crédito que permita pôr fim aos outros créditos ficando apenas com uma prestação. Esta solução poderá permitir uma redução nos seus encargos, visto que, na maior parte das vezes, conseguem-se melhores condições que a média de todos os seus créditos.
- Ter um fundo de emergência é muito importante para combater eventuais
imprevistos. Se depois de pagar todas as despesas correntes do mês lhe sobrar
algum dinheiro, pense em aplicar algum ou a totalidade desse valor em poupança. Se
possível, o fundo de emergência deve ser capaz de cobrir cinco a seis vezes o
rendimento mensal.
O que fazer em caso de sobre-endividamento
É imperativo que em primeiro lugar, não deixe a situação arrastar-se, procure renegociar a
dívida, se não conseguir pagar, deve falar com o banco ou financeira. As instituições de
crédito, quando avisadas pelos clientes de que existe um risco de incumprimento, devem
prestar apoio e colaborar de modo a encontrar uma solução. Para prevenir o sobre-endividamento, o Banco de Portugal estabeleceu uma medida chamada (PARI) Plano de Ação para o Risco de Incumprimento (Decreto-Lei nº 227/2012).
Este plano determina que as instituições de crédito devem acompanhar, de forma permanente e sistemática, os contratos de crédito concedidos aos seus clientes, de forma a detetar eventuais indícios de incumprimento. O objetivo é promover ações rápidas na prevenção do incumprimento e do endividamento. Inserem-se no âmbito do PARI, situações de dificuldade de pagamento relacionadas com créditos imobiliários, crédito pessoal ao consumo e operações com cartão ou cartões de crédito.
Para situações em que o cliente já se encontra em situação de incumprimento (1 ou 2 meses), existe ainda um conjunto de mecanismos destinados a promover a regularização dos contratos de crédito, denominado Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI).
O PERSI tem como objetivo avaliar o motivo de incumprimento e a situação financeira do consumidor, com o intuito de propor soluções viáveis para a regularização de crédito, podendo também o cliente propor soluções que considere apropriadas. Inserem-se no âmbito do PERSI, situações de incumprimento relacionadas com créditos imobiliários, crédito pessoal ao consumo e operações com cartão ou cartões de crédito.
Os clientes podem também solicitar à Central de Responsabilidade de Crédito, no Banco de Portugal, o mapa de responsabilidade de crédito, onde pode avaliar as responsabilidades assumidas e as potenciais. Esta informação é importante de modo a ter uma visão mais detalhada da sua situação financeira, e perceber se pode pagar as dívidas antes que elas se acumulem.
A quem devo recorrer
Pode recorrer à Rede de Apoio ao Consumidor Endividado (RACE) onde pode pedir informação, aconselhamento ou acompanhamento caso se encontre em risco ou já tenha entrado em incumprimento.
Pode também contactar o Gabinete de Orientação ao Endividamento dos Consumidores (GOEC) que dá resposta aos riscos crescentes com que se deparam os consumidores. O Gabinete de Apoio ao Sobre-endividado (GAS), criado pela DECO em 2000, também presta apoio a famílias em situação de incumprimento, sendo que as dívidas devem ter por base uma relação de consumo e não podem estar em tribunal.
O sobre-endividamento é algo que pode ser evitado, por isso, é fundamental ter uma atitude responsável planeando e acompanhando com rigor a evolução do seu orçamento. Se essa análise mostra uma situação financeira frágil, tente aprender a definir necessidades e suas prioridades.